domingo, 6 de maio de 2012



No elevador do filho de Deus - Elisa Lucinda


A gente tem que morrer tantas vezes durante a vida 
Que eu já tô ficando craque em ressurreição. 
Bobeou eu tô morrendo 
Na minha extrema pulsão 
Na minha extrema-unção 
Na minha extrema menção 
de acordar viva todo dia 
Há dores que sinceramente eu não resolvo 
sinceramente sucumbo 
Há nós que não dissolvo 
e me torno moribundo de doer daquele corte 
do haver sangramento e forte 
que vem no mesmo malote das coisas queridas 
Vem dentro dos amores 
dentro das perdas de coisas antes possuídas 
dentro das alegrias havidas 

Há porradas que não tem saída 
há um monte de "não era isso que eu queria" 
Outro dia, acabei de morrer 
depois de uma crise sobre o existencialismo 
3º mundo, ideologia e inflação... 
E quando penso que não 
me vejo ressurgida no banheiro 
feito punheteiro de chuveiro 
Sem cor, sem fala 
nem informática nem cabala 
eu era uma espécie de Lázara 
poeta ressucitada 
passaporte sem mala 
com destino de nada! 

A gente tem que morrer tantas vezes durante a vida 
ensaiar mil vezes a séria despedida 
a morte real do gastamento do corpo 
a coisa mal resolvida 
daquela morte florida 
cheia de pêsames nos ombros dos parentes chorosos 
cheio do sorriso culpado dos inimigos invejosos 
que já to ficando especialista em renascimento 

Hoje, praticamente, eu morro quando quero: 
às vezes só porque não foi um bom desfecho 
ou porque eu não concordo 
Ou uma bela puxada no tapete 
ou porque eu mesma me enrolo 
Não dá outra: tiro o chinelo... 
E dou uma morrida! 
Não atendo telefone, campainha... 
Fico aí camisolenta em estado de éter 
nem zangada, nem histérica, nem puta da vida! 
Tô nocauteada, tô morrida! 

Morte cotidiana é boa porque além de ser uma pausa 
não tem aquela ansiedade para entrar em cena 
É uma espécie de venda 
uma espécie de encomenda que a gente faz 
pra ter depois ter um produto com maior resistência 
onde a gente se recolhe (e quem não assume nega) 
e fica feito a justiça: cega 
Depois acorda bela 
corta os cabelos 
muda a maquiagem 
reinventa modelos 
reencontra os amigos que fazem a velha e merecida 
pergunta ao teu eu: "Onde cê tava? Tava sumida, morreu?" 
E a gente com aquela cara de fantasma moderno, 
de expersona falida: 
- Não, tava só deprimida.


Foto: Helena Damasceno

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012


Cerveja Devassa, você não me engana

Devassa é uma palavra que pode significar busca, diligência, investigação. Ex: fizeram uma devassa no escritório daquele homem. Mas esse termo é geralmente usado (de forma depreciativa) para as mulheres descrevendo-as como insaciáveis, desprovidas de pudores morais com relação ao sexo, libertinas, vadias.

Ocorre que uma cerveja ter esse nome tudo bem, o problema reside na forma publicitária de vender o “produto”. Usa a mercantilização do corpo feminino e tem como mote: “todo mundo tem um lado devassa”.

Quer enganar a quem, cara pálida?

Devassa é um adjetivo feminino. E se queriam de fato, atingir a homens e mulheres deveriam ter corrigido o equívoco gramatical: “todo mundo tem um lado devasso”. Mas não ia combinar com o nome da cerveja, não é?

Então... a verdade é que o objetivo é mesmo falar da mulher enquanto um produto que é vendido junto com a marca. Por quê não tem homens na publicidade da cerveja se insinuando como “devassos” e sim mulheres seminuas com cara - perdoem-me a forma chula – de quem “quer dar”?

Isso fica cada vez mais claro quando se divide a cerveja baseando-se nas variações de raça/cor das mulheres (devassa loira, devassa morena, devassa ruiva, devassa negra).

Mensagem subliminar: a mulher bebe a cerveja e “libera” seu lado devassa para os homens...

Não sei quanto às outras mulheres, mas isso a mim incomoda e agride!

E tem mais, detestei a tal cerveja... ela nem de longe representa o que é ser mulher e o que uma mulher “procura” quando bebe cerveja!

Cerveja sexista e desrespeitosa, denegrindo a imagem da mulher, ultrapassando os limites da sexualidade feminina... não, obrigada!